Quando o sol nasce na pequena área de Piracanga (BA), localizada a 60 km de Ilhéus, as crianças da comunidade já começam a se preparar para mais um dia de aula na Escola Livre Experimental. Em uma casa de madeira, com telhado de bambu, envolta pela natureza e banhada pelo Rio Paracanga, elas se acomodam para o começo das atividades. Contudo, isso só ocorre quando os alunos desejarem.
Nesse tipo de escola, o estudante diz quando se sente preparado para estudar, é quem escolhe as oficinas de que vai participar e o dia em que está apto para avançar de nível. A proposta é que os alunos aprendam por sua genuína vontade. São os princípios básicos do que se chama de escola experimental.
Segundo a pedagoga Patrícia Fonte, autora do livro A Paixão de Educar e o Desafio de Inovar e diretora da Projetos Pedagógicos Dinâmicos, esse conceito abriga todas as instituições educacionais que não seguem o método tradicional de ensino, no qual o professor explica, o aluno escuta e todas as classes são voltadas para o quadro negro.
Porém, ainda são poucos os colégios que adotam métodos pedagógicos alternativos no Brasil. E foi por isso que Patrícia matriculou a filha em uma instituição tradicional. "Foi por falta de opção. Acredito muito nas escolas experimentais, pois existe um dinamismo que motiva a criança a buscar o próprio aprendizado, o que passa a ser mais significativo para elas", afirma.
Para a pedagoga, no sistema tradicional os alunos viram meros transmissores de conhecimentos decorados, voltados somente para o vestibular. "Eles não são ensinados a refletir, argumentar", queixa-se. Mestre em Educação da Criança, José Pacheco concorda: "a escola dita tradicional mantém-se conivente com o estímulo da competitividade, fomenta o imediatismo e a frivolidade", diz.
Na Escola Livre Experimental de Piracanga não tem sala de aula. No lugar, há vários espaços criativos e de estudo. Lá, as crianças são separadas em grupos de, no máximo, 15 alunos, classificados de acordo com a idade. Cada grupo tem seu espaço, mas também existem muitas áreas em comum: como a oca para as meditações, a cozinha, a marcenaria e a oficina de artesanato. "O que caracteriza essas escolas é o ecletismo. Mas todas tratam de 'acabar com a sala de aula' e incentivar a descoberta do aprendizado", reforça Pacheco.
Durante o dia, as crianças e os jovens, que são aceitos a partir dos três e até os 18 anos de idade, têm a possibilidade de escolher diferentes atividades. Em uma sala, por exemplo, fica uma tutora lendo histórias. Em outra, uma professora ensina pintura. Cabe a cada criança escolher o que mais a atrai. Segundo a direção, as crianças aprenderão a optar e a viver as consequências e os deveres de cada escolha que fizerem.
Todos os dias são oferecidas atividades como ensino de idioma (inglês, francês, espanhol), natação, aulas de massagem, meditação, dança, jogos de integração do grupo, passeios, teatro e cinema. Cada aluno deve optar por uma dessas programações, que depois de cumprida, deve ser substituída por outra.
Considerando as distintas etapas de desenvolvimento, as crianças recebem dos adultos ajuda em áreas como matemática, geografia, história, língua portuguesa, sociologia, física, biologia e química. Ou seja, independentemente das escolhas do estudante, essas disciplinas são inseridas de forma indireta dentro do dia a dia escolar. Ao trabalhar com uma oficina de teatro, por exemplo, alguns conteúdos de história são trabalhados. E ao realizar oficinas de culinária, o aluno também terá aulas de matemática.
O método não-diretivo de ensino propõe que as crianças decidam aprender por interesse próprio e não por serem obrigadas. Elas acabam sendo expostas aos mesmos conteúdos que uma escola tradicional, mas de forma lúdica e no tempo de cada uma delas. Para a pedagoga Patrícia, pelo fato de os alunos estudarem por espontânea vontade, o ensinamento é mais atrativo e os conteúdos acabam mais fortemente fixados.
Mas permitir que o aluno aprenda quando quiser também pode representar um risco. Ana, nome fictício de uma mãe que preferiu não se identificar, matriculou os dois filhos, um de 7 e outro de 4 anos, em uma escola experimental de São Paulo (SP). Segundo ela, o mais novo se adaptou bem. "Ele é curioso e desinibido. Já está conseguindo ler com quatro anos", conta.
Porém, o filho mais velho está cada vez mais deprimido e sem vontade de ir para a aula. "Todo dia ele chora e me pede para ficar em casa", diz. Ana descobriu que a turma do filho está em fase de alfabetização, mas que, por acreditar em uma linha pedagógica construtivista, o colégio incentiva que cada um aprenda no seu tempo.
Para a mãe, quando a professora pede que cada aluno escreva a palavra flor, por exemplo, da forma como acha que está correto, o filho se sente pressionado, pois quer acertar. "Ele sempre foi muito perfeccionista. Desde pequeno se exige muito, então, fica nervoso. Se pedem para escrever flor, ele quer escrever do jeito certo. Tem pavor de errar", relata.
Para Pacheco, tudo é uma questão de adaptação. Já a pedagoga Patrícia alerta para a necessidade de os pais estarem atentos. "É experimental. Para algumas crianças funciona, para outras não. Cabe aos pais observar seus filhos e detectar isso", diz. Foi assim com Ana. "Percebi que, para a personalidade do mais velho, o melhor é a escola tradicional", diz a mãe, que contratou um professor particular para o filho até o início do ano que vem, quando pretende levá-lo para outro colégio.
O processo de troca, aliás, também precisa ser observado. A escola do filho de Ana, por exemplo, tem séries definidas. Porém, em alguns colégios experimentais não existe o conceito de série. Nesses casos, se a criança for para uma escola tradicional, geralmente passa por um teste de nivelamento antes de ser admitida na nova instituição.
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