EDUCAÇÃO, LIBERDADE E ALTERIDADE
Educação

EDUCAÇÃO, LIBERDADE E ALTERIDADE



Educação, liberdade e Alteridade

Por: Jorge Schemes*

A educação precisa partir do pressuposto de que o ser humano é livre. Para J. P. Sartre “todos somos condenados à liberdade”, isto é: nossas escolhas é que nos fazem livres, porque liberdade absoluta não existe. Emanuel Kant afirmava: “eu dou a mim mesmo a própria lei”, estabelecendo o princípio da autonomia moral. Partindo deste pensamento, há duas maneiras de agir: ação conforme o dever e ação por dever. Qual a diferença entre elas? Na ação conforme o dever age-se por determinação externa (ação heterônoma). Na ação por dever acontece o contrário, ou seja, a autonomia. A ação conforme o dever não tem valor moral porque é obrigação. Por outro lado, a ação por dever parte do princípio interno da autoconsciência e da autonomia moral.

O paradigma da liberdade do outro

A liberdade começa quando garantimos a liberdade do outro, na realidade ela não termina nem começa, pois está sempre em construção. Só há moral, justiça e direitos quando garantimos a liberdade do outro. Na educação, nossas atitudes podem se tornar obstáculos para a construção da liberdade dos alunos. Não raro, a construção do ser humano em si é relegada ao segundo ou terceiro plano, e passa-se a dar mais importância para uma vírgula ou um ponto que foi esquecido. Todavia, vale refletir: o que realmente tem valor e importância na educação? Que concepções norteiam a prática pedagógica? Diante destes questionamentos podemos afirmar que o que ainda orienta a educação é a ação conforme o dever, o que não é de todo errado, afinal, a sociedade é construída e orientada por este princípio, no entanto, a escola precisa ir além e ser conduzida pelo princípio da ação por dever: olhar a complexidade do ser humano enquanto ser em constante estado de educação.
A questão posta é a necessidade de mudança de paradigma e o objetivo de não ser um obstáculo à liberdade do outro. Faz-se necessário ter uma postura fenomenológica e não apenas positivista frente aos alunos. Todavia, construir a liberdade garantindo que ela esteja no outro não é tarefa simples. Reprimir, os que segundo nossa visão, agem fora do dever, significa desconstruir a liberdade. Por outro lado, é fundamental possibilitar que crianças e adolescentes se reconheçam como seres humanos e consigam conviver harmoniosamente com as diferenças e com o que trazem no coração. Os alunos percebem quando o professor age apenas conforme o dever (heteronomia), e quando age por dever (autonomia). O professor deve estar autoconsciente do valor dos seus alunos enquanto seres humanos em si mesmos, e não apenas como receptores de conteúdos.

Ética da alteridade: olhar o rosto dos alunos

Para que a construção da liberdade seja possível, é necessária a ética da alteridade. Para Emmanuel Lévinas, o princípio da ética da alteridade é o respeito pelo diferente. O rosto do outro nos convoca, nos interpela e nos convida. A ética da alteridade no rosto do outro revela o seu infinito. Esta ética da alteridade revelada no rosto quebra os paradigmas tradicionais estabelecidos por outras éticas, como por exemplo, a ética utilitarista que tem como lema: “os fins justificam os meios”. Todavia, o que identifica o outro é o seu rosto, e é muitas vezes no rosto do outro que eu encontro a minha própria identificação. Cada rosto é diferente, mas me dá o sentido do respeito. No face a face eu me vejo no outro. Quando o professor aprender a olhar no rosto de seus alunos e não apenas no diário de classe, quando permitir ser olhado, o senso do respeito ao outro e ao que é diferente, surgirá. Este senso surge quando identificamos o rosto e permitimos ser identificados. Muitas vezes para ver o rosto do outro é preciso olhar com outras lentes, de preferência com a lente do outro, e procurar ver como o outro vê. Apreender o sentido e o infinito no rosto do outro é a ética da alteridade.
Nosso discurso hoje não pode estar embasado em éticas reducionistas, mas na ética da alteridade. Podemos perguntar: que práticas e que discursos éticos estão sendo realizadas e teorizados em sala de aula? Porventura serão práticas e discursos excludentes? Deve-se levar em consideração que ética não é apenas um discurso vazio, mas a vida, os laços e a manifestação concreta do outro. Há muitas “verdades” cristalizadas na educação que precisam ser jogadas fora, pois são excludentes e ferem a ética do diferente, da alteridade, da inclusão.
Educação, seja no nível que for, não é mais doutrinar e excluir o diferente dentro de uma concepção metafísica de ser humano. Éticas reducionistas levam à discriminação, enquanto que a ética da alteridade leva a uma prática de respeito e tolerância, pois liberta do preconceito. E tudo isso começa pelo olhar o rosto do outro, por prestar atenção e saber ouvir o outro olhando em seus olhos e vendo de perto o seu rosto. Não é um olhar superficial, é um olhar de empatia, de sentir o que o outro sente, de sentir o que pensa e como vê a vida. Resumindo, é uma ética da alteridade empática, onde a prática pedagógica será libertadora dos estereótipos, pré-julgamentos, preconceitos e exclusão do diferente, tendo como resultado o respeito pelo outro como ser humano único e especial. Para tanto, talvez seja necessário quebrar paradigmas ultrapassados, quebrar o próprio conhecimento construído de maneira fragmentada e formatado para não ver o rosto do outro. Se isso for preciso, será necessário ao mesmo tempo, alimentar o espírito com novos paradigmas, com embasamento teórico epistemológico a favor da ética da alteridade. Para isso é essencial e sumamente necessário ter humildade.
Os alunos percebem se o professor é coerente ou não. A ética da alteridade pressupõe um comportamento de imparcialidade, justiça, humildade e apreensão do outro, do que é diferente. Assim, ter ética é ter uma atitude positiva perante o outro, pois ética é uma ação que não causa sofrimento em ninguém. Uma pessoa ética torna o ambiente saudável. A coerência entre teoria e prática é fundamental na educação. O grande desafio é formar uma autoconsciência crítica, e estabelecer uma coerência entre a epistemologia da ética da alteridade e a prática desta ética no cotidiano das relações interpessoais, seja dentro da comunidade escolar, seja na própria vida.


*Jorge Schemes – (47)88294706
www.jorgeschemes.blogspot.com
Bacharel em Teologia Línguas Bíblicas (Grego e Hebraico) – SALT – São Paulo – SP
Licenciado em Pedagogia – Séries Iniciais e Administração Escolar – ACE – Joinville
Pós-Graduado em Interdisciplinaridade com Metodologia do Ensino Superior – IBPEX/UNIVILLE
Pós-Graduado em Psicopedagogia Clínica e Institucional – IBPEX/FACINTER – Joinville
Licenciado em Ciências da Religião – Habilitação em Ensino Religioso - FURB – Blumenau
Técnico Pedagógico na GEECT – Gerência da Educação, Ciência e Tecnologia – Joinville
Professor de Filosofia da Educação, Gestão e Organização do Trabalho Escolar, Empreendedorismo, Trabalho e Educação na FEJ – ACE – Joinville, SC.
Professor de Sociologia e Antropologia na Faculdade de Psicologia da ACE.
Professor de Religião no Instituto de Parapsicologia de Joinville, SC.



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